Maílson da Nobrega
O
Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo. Certo. Também tem um dos
maiores níveis de emprego informal do planeta. Correto. As duas
expecionalidades resultam de problemas estruturais acumulados ao longo de
muitos anos, de díficil solução a curto e médio prazos e dependentes de
complexas reformas institucionais. Os bancos não são, ao contrário do que se
pensa, os grandes culpados pelas altas taxas de juros, assim como os
empresários não são a causa da informalidade no mercado de trabalho.
Mesmo
assim, a presidente Dilma fez ontem à noite um duro e assustador ataque contra
os bancos, em cadeia nacional. Para ela, é “inadmissível que o Brasil, que tem
um dos sistemas financeiros mais sólidos e lucrativos do mundo, continue com os
juros mais altos do mundo”. Essa, convenhamos, é a percepção da maioria. Há,
todavia, muitos estudos que explicam as razões das altas taxas de juros no
país, inclusive no governo (Dilma e seus assessores podem ter acesso fácil a
esses estudos no site do Banco Central). As taxas de juros altas refletem
nossas próprias excepcionalidades em fatores que influenciam o tamanho do
spread bancário. Nenhum outro país tributa tanto as transações financeiras ou
tem tanto recolhimento compulsório de bancos ao Banco Central. Há outros
fatores, como já comentei anteriormente neste blog.
A
cruzada contra os bancos tem tudo para aumentar a popularidade da presidente.
Com o intuito de reforçar os ganhos, ela incitou a população a forçar a queda
da taxa de juros. Bancos não são populares em canto nenhum, mas no Brasil eles
chegam a ser odiados. A desinformação, o preconceito e a ideologia formam um
caldo complicado. Muita gente deve estar aplaudindo o discurso e dizendo
impropérios contra quem criticar Dilma (como faço agora). A exemplo de outras
vezes, deverei ser condenado e espezinhado pelo que escrevo, assim que este
texto circular no Facebook.
Investir
contra espantalhos e mirar efeitos com objetivos políticos tem sido uma
característica de governos populistas. Atacar sintomas que a população confunde
com causas gera ganhos de popularidade ou reverte sua perda. A perda ainda não
é o que move Dilma a atacar os bancos, mas foi o caso dos generais argentinos
que invadiram as Malvinas e da recente desapropriação, pela presidente Cristina
Kirchner, das ações da Repsol na empresa petrolífera argentina YPF. Tal qual
aconteceu em ações populistas semelhantes, particularmente no período de Juan
Perón, o povo argentino apoiou: 62% se disseram a favor da desapropriação. O
preço, como no passado, será altíssimo. Como diz a pida, “as consequências vêm
depois”. A cruzada contra os bancos inclui determinação para que os bancos
públicos reduzam as suas taxas de juros. A consequencia poderá ser enormes
prejuízos para essas instituições, que serão pagos pelos contribuintes.
Nos
tempos do Plano Cruzado, começou a faltar carne nos supermercados e açougues.
Era um sintoma de uma causa – o congelamento dos preços – difícil de ser
identificada pela população. A carne faltava porque o preço do boi gordo,
tabelado, era inferior aos custos de produção. Vender a tal preço signficaria a
falência. Como ocorreu em outros períodos da história mundial, os pecuaristas
procuraram preservar o patrimônio duramente construído. Era melhor guardar o
boi, arcando com o respectivo custo, do que levá-lo com prejuízo ao matadouro.
Como
se recorda, o governo empreendeu, com apoio do ministro da Fazenda Dilson
Funaro, uma ridícula ação de caça ao boi no pasto, empregando helicópteros e
policiais federais. Deu no que deu. O errado era prolongar um congelamento
insustentável, não a reação dos pecuaristas. Eles não eram especuladores, como
se falava. Apenas buscavam se salvar da insanidade destruidora do governo. Do
jeito que a coisa vai, Dilma terminará caçando juro no pasto. Isso porque, ao
contrário do que ela e seus assessores pensam, os juros no Brasil não vão
convergir tão cedo para níveis internacionais. A informalidade do mercado de
trabalho tampouco será em breve a dos países desenvolvidos. Cabe lembrar que
Funaro tabelou, sem sucesso, o spread bancário. Dilma fará o mesmo? Não me
surpreenderia.
O
Brasil vem perdendo o encanto em certos círculos no exterior, isto é, os que
acompanham de perto os rumos da gestão governamental, particularmente da
política econômica. A percepção de perda de dinamismo da economia brasileira é
crescente. E das intervenções mal feitas na economia também. Isso leva tempo
para se disseminar. Em algum momento, chegará às áreas de planejamento
estratégico das empresas que investem ou pensam em investir no Brasil. O
discurso de Dilma contra os bancos dará uma contribuição adicional para a
mudança de percepção de aumento dos riscos.
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