sábado, 25 de fevereiro de 2012

A corrupção em perspectiva

          Sempre desconfio do discurso de que certas coisas eram melhores no passado. Dizem que em períodos pretéritos, as pessoas eram mais honestas e honradas, os produtos duravam mais, etc. Como exceção da escola pública, que quase todos dizem que era melhor – apesar de não se comparar o que era ensinado à época com o conteúdo atual -, muitos dizem que “antes que era bom”. Na política, muitos são os viúvos e viúvas dos militares, do período do “milagre econômico”, do “Brasil potência”, embora não saibam – ou se esqueceram? – de que a dívida externa foi concebida nesta infeliz quadra histórica; dívida que pagamos até hoje, que o seu serviço e a sua rolagem muito nos custa e nos tira verbas importantíssimas da saúde e educação pública. Além da saudade da forma sui generis de fazer política da Ditadura Militar, muitos dizem – sejam jovens ou mesmo pessoas mais velhas que viveram durante o período -, que a população, o povo ou a sociedade civil era mais ativa, mais combativa em relação aos desmandos políticos. Sobre isso tenho minhas desconfianças também, já que à época havia um inimigo declarado – ou melhor, havia vários dependendo da perspectiva político-ideológica: para a esquerda, os militares; para a direita, o “perigo comunista” e os grupos ligados à luta armada.
         Na esteira da noção de que as pessoas eram mais honestas – e isso vale até para os militares -, dizem por aí que não havia tantos políticos desonestos, de sorte que a corrupção não grassava como acontece hoje. É possível comparar os contextos históricos? Há como medir o grau de corrupção? Não sei ao certo, mas acredito que seja o oposto. Se entendermos que os seres humanos agem por meios de incentivos – pecuniários ou não -, a existência de corrupção é fruto do sistema político atual e do “agir ético”, ou melhor, da falta dele. Para fundamentar minha visão otimista atinente à diminuição da corrupção, se se busca diminuí-la, deve-se obrigatoriamente reduzir os espaços que ela possa florescer, sobretudo, por meio de mecanismos criados em períodos recentes, como a exigência de licitação pública para compra de materiais e contratação de serviços no setor público, lei criada no início dos anos 90; recordo também a Lei de Responsabilidade Fiscal, criada em 2000, que trouxe avanços para a moralidade da atividade política – embora necessite de melhorias e ajustes com o passar dos anos. Enfoco também a criação da lei da Ficha Limpa, fenômeno recentíssimo que, mais do que outro parafuso nesta engrenagem político-normativa, tem origem popular - sem dúvida algo notável. Nesta mesma linha, ressalto a criação de inúmeras Ongs e associações que fiscalizam as contas públicas de prefeituras.
         Este breve périplo sobre os recentes mecanismos de moralização da atividade política serve para negar a tese acima citada: de que antes as pessoas eram mais ativas politicamente, em detrimento da “pasmaceira” atual, que pouco se importa para o que ocorre no submundo da atividade pública. Para mim, a edição destas leis, bem como a criação de novos entes políticos, é fruto da pressão popular que, mais educada e mais livre, é capaz de controlar – mesmo que minimamente -, as ações dos governos que sucederam ao longo dos últimos quinze ou vinte anos. Significa também que a corrupção, embora endêmica atualmente, pode passar a diminuir em um futuro nem tão distante.
         Contudo, sua diminuição, como se vê, é lenta e gradual. Lenta e gradual porque a forma e o método democrático, baseado na “lógica do acerto e do erro”, é moroso; se por um lado é assim, sua positividade está no fato de que é um sistema capaz de consolidar seus ganhos, firmando novos valores e princípios com o passar do tempo. Em que pese a cruel realidade hodierna, especialmente em tempos de processo eleitoral, com a aparição de escândalos que envolvem ambos os candidatos, o ponto a ser destacado é que há mecanismos concretos de combate à corrupção, que se ainda não são capazes de miná-la satisfatoriamente, ensejam esperanças de dias melhores. A luta, entretanto, é árdua, já que a corrupção é alimentada pela lamentável cultura política brasileira, composta por séculos de patrimonialismo, compra de votos, ausência de espírito republicano, utilização da máquina pública, etc.
         Para aqueles descrentes em relação à regeneração da atividade política, finalizo o texto com uma célebre frase de Edmund Burke, político conservador inglês do século XVIII: “A única coisa necessária para o triunfo do mal é o que os homens bons não façam nada”. 

Um comentário: