Merval Pereira
A imprensa enfrenta no mundo permanente batalha de credibilidade, que
volta e meia é perdida. Embora aqui no Brasil ainda apareça entre as
instituições mais respeitadas pela opinião pública, há um desconforto na
relação da imprensa com a sociedade. Se de um lado ela ainda depende da
imprensa para ter seus direitos respeitados e para que denúncias sejam
investigadas pelos governos, de outro há questionamentos persistentes quanto à
irresponsabilidade do noticiário, sobre as acusações veiculadas — o que muitos
classificam de denuncismo — ou quanto ao superficialismo do noticiário.
A imprensa aqui, mais que em outras partes, se transforma em poder por
uma disfunção dos demais poderes. Ao produzir um primeiro nível de conhecimento
dos fatos — o que muitos definem como um rascunho da História —, exerce o papel
socialmente relevante de ser um canal de comunicação que liga Estado e nação,
mas também os muitos setores da nação entre si. É sua atribuição fazer com que
o Estado conheça os desejos e as intenções da nação, e com que esta saiba os
projetos e desígnios do Estado.
No sistema democrático, a representação é fundamental, e a legitimidade
da representação depende muito da informação, que aproxima representados e
representantes. Nunca é demais relembrar o grande jornalista
americano Jack Anderson, considerado o pai do jornalismo investigativo, segundo quem a necessidade de a imprensa ocupar um lugar antagônico ao governo foi percebida com clareza pelos fundadores dos Estados Unidos, e por isso tornaram a liberdade de imprensa a primeira garantia da Carta de Direitos.
americano Jack Anderson, considerado o pai do jornalismo investigativo, segundo quem a necessidade de a imprensa ocupar um lugar antagônico ao governo foi percebida com clareza pelos fundadores dos Estados Unidos, e por isso tornaram a liberdade de imprensa a primeira garantia da Carta de Direitos.
“Sem liberdade de imprensa, sabiam, as outras liberdades desmoronariam.
Porque o governo, devido à sua própria natureza, tende à opressão. E o governo,
sem um cão de guarda, logo passa a oprimir o povo a que deve servir”.
O presidente americano Thomas Jefferson entendeu que a imprensa, tal
como o cão de guarda, deve ter liberdade para criticar e condenar, desmascarar
e antagonizar.
Não obstante todos os novos recursos tecnológicos e as mudanças na
sociedade que colocam o cidadão como protagonista, é o jornalismo, seja em que
plataforma se apresente, que continua sendo o espaço público para a formação de
um consenso em torno do projeto democrático. E os jornais ainda são a fortaleza
maior do jornalismo de qualidade, tão importante para a democracia. A tese de
que as novas tecnologias, como a internet, os blogs, o Twitter e as redes
sociais de comunicação, como o Facebook, seriam elementos de neutralização da
grande imprensa é contestada por pesquisas.
Uma, recente, da Associação de Jornais dos EUA (NAA na sigla em inglês)
mostrou que os jornais tradicionais são marcas confiáveis para as quais o
leitor corre quando algo importante acontece. A pesquisa mostra que ¾ de todos
os usuários da internet têm os jornais como principal fonte de notícias, e os
leem em várias plataformas.
Não é à toa que os sites e blogs mais acessados tanto nos EUA quanto no
Brasil são aqueles que pertencem a companhias jornalísticas tradicionais, já
testadas na árdua tarefa de selecionar e hierarquizar a informação. O
jornalismo profissional tem uma estrutura, uma forma profissional de colher e
checar informações que a vasta maioria dos blogueiros não tem. Não há dúvida de
que, com o surgimento das novas tecnologias, os jornais perderam a hegemonia da
informação, mas continuam sendo fatores fundamentais para cidadania.
São novos desafios, como o de explorar uma intensa variedade de meios de
levar informação ao leitor sem ao mesmo tempo sufocá-lo com informação demais,
produzindo a desinformação, que surge da profusão da informação, de seu
encantamento, de sua repetição em círculos, na definição do filósofo francês
Jean Baudrillard.
O filósofo alemão Jürgen Habermas define como a dupla função do que
chama de “a imprensa de qualidade” atender à demanda por informação e formação.
No texto “O valor da notícia”, ressalta que estudo sobre fluxos de comunicação
indica que, ao menos no âmbito da comunicação política, a imprensa de qualidade
desempenha papel de “liderança”: o noticiário político de rádio e TV depende
dos temas e das contribuições provenientes do que chama de jornalismo
“argumentativo”.
Sem o impulso de uma imprensa voltada à formação de opinião, capaz de
fornecer informação confiável e comentário preciso, a esfera pública não tem
como produzir essa energia, diz Habermas.
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